terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

SSÓ, PIGLIA E CONCURSOS LITERÁRIOS

O amigo Ernani Ssó, em sua coluna desta semana no Coletiva.net:
Mal saiu, o romance de Ricardo Piglia faturou o prêmio Crítica, da Associação Espanhola de Críticos Literários, o venezuelano Rómulo Gallegos e o Hemmett da Associação Internacional de Escritores Policiais. Com isso, faturou também uma boa bufunfa. Assim, eu começar a falar mal pode parecer que estou roxo ou verde de inveja — me desculpem a imprecisão.
Piglia, com seu livro anterior, “Plata quemada”, ganhou o prêmio da editora Planeta: 40 mil dólares. É o seguinte: Piglia tinha o romance contratado com a Planeta; Piglia tinha uma dívida com a editora, tanto que recebeu o prêmio apenas de faz de conta; a única jurada que se manifestou disse que jamais chegou às suas mãos “El amor enfermo”, de Gustavo Nielsen, um dos dez finalistas (que entrou na justiça contra a corja toda e ganhou); o presidente do júri era Guillermo Schavelzon, gerente da editora, organizador do prêmio e agente de Piglia; um ano antes, Miguel Delibes e Ernesto Sábato renunciaram de antemão a esse mesmo prêmio, denunciando que tinham oferecido a vitória a eles. Piglia não foi triturado pela imprensa por participar de uma jogada dessas porque é muito bem relacionado e queridinho de boa parte da crítica.
Pelo menos “Plata quemada” é um bom livro. Não acontece o mesmo com “Blanco nocturno”, romance chato, convencional e com uma trama sem pé nem cabeça. Pra completar, traz uma série de notas de pé de página que pode ser definida com apenas uma palavra: bisonha.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

CONCORDO E REPLICO

Acabo de receber este texto na minha CP. 

Dizem que, no Brasil, os livros são muito caros e que as pessoas não têm o hábito da leitura – o que hão de concordar, não deixa de ser realidade. Tendo conhecimento disso, que há um novo mercado a ser desbravado, com consumidores em potencial, que uma nova classe média pede passagem, mas que, para conquistá-la e transformá-la em leitores e, por consequência, consumidores de livros, devemos também dar nossa contribuição, em razão de sermos os principais interessados que o mercado livreiro cresça substancialmente, como em países da Europa e até mesmo como nossa vizinha Argentina. Se compararmos a população dos dois países versus a quantidade de livros lidos por habitante; ainda temos muito que conquistar.

Dentro desse contexto, em 2001, criamos um novo conceito em livrarias, pois percebemos um novo nicho de mercado, ante a necessidade de livros a preços acessíveis de verdade. Começamos então, vender livros a preços bastante atraentes (R$1,00, R$ 2,00, R$ 3,00, R$ 5,00, R$ 7,00 e R$ 9,00)[1] Logo, descobrimos que talvez não tínhamos o hábito da leitura entre nós, não porque éramos ignorantes literários, mas porque nossa renda não permitia adquirir um produto que, naquele momento, talvez fosse supérfluo. Vencemos a primeira etapa, que era um preço acessível a todos.

Mas, ao longo dos anos, com experiência acumulada e após ouvirmos nossos clientes, descobrimos que outras barreiras se opunham ao comércio do livro em nosso país. Percebemos que as pessoas gostariam que os livros fossem até elas e não ao contrário. Com isso, passamos a participar de feiras livres, em praças, colégios, terminais de ônibus, entre outros[2]. Mais uma vez os resultados favoráveis nos mostraram que estávamos no caminho certo, e mais uma etapa estava vencida, mas ainda não era o suficiente.

Com o passar dos anos nosso estoque foi aumentando[3], devido ao grande número de parceiros que nos procuraram oferecendo seus livros para comercialização. Uma nova etapa chegou, a de galgar melhores resultados. Partimos então para as grandes feiras e Bienais, as de maior expressão para o mercado livreiro. Infelizmente, diferente do que imaginávamos, não fomos visto com bons olhos por alguns participantes e até mesmo organizadores dessas feiras. Diziam que nosso estande era incômodo devido aos preços baixos por nós praticados. Chegou ao absurdo de um organizador nos dizer que a localização adequada ao nosso estande, naquele evento, seria na cozinha da feira, ou seja, no final do pavilhão. Era o mesmo que dizer que não nos queriam no evento e que nosso dinheiro não tinha o mesmo valor dos demais expositores, haja vista que o preço pago pelo estande era o mesmo para todos.

Onde queremos chegar com tudo isso? É simples a resposta, queremos apenas chamar a atenção para o fato de que estamos elitizando nossas feiras de livros. Não temos o direito de privar as camadas menos favorecidas de nossa sociedade de ter acesso aos livros. Não podemos negar-lhes o prazer da leitura, pois como profissionais do livro, temos um compromisso ético e moral com nosso país. Precisamos sim ter lucros, mas também precisamos do olhar e sorriso sinceros de uma criança que, com seu livrinho numa sacola, nos diz: “Muito Obrigado!”. É assim que construiremos um país de leitores. Cabe não só ao governo, mas também a nós, como livreiros que somos, contribuirmos para que isso se torne realidade, uma feira de todos e para todos.

Quando falo que nossas feiras estão sendo elitizadas, devo uma explicação. Porém, antes de me explicar, deixo claro que não sou contra a cobrança de ingressos, mas que não concordo com o valor absurdo, abusivo e limitador (ou seletivo) de classes sociais. Farei diferente, darei abaixo, alguns exemplos, para que tirem suas próprias conclusões.

1) Em 2010, a 21ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo foi um sucesso, com excelente organização, visitação pública expressiva, uma verdadeira festa literária.

Valor do ingresso – R$ 10,00 (dez reais).

Mas, vejam bem, São Paulo tem 11.000.000 (onze milhões) de habitantes; 7.000.000 (sete milhões) de veículos e uma renda per capita de R$ 26.202,00, segundo pesquisa realizada pelo IBGE, no ano de 2009.

2) Também no ano de 2010, realizou-se a 2ª Bienal do Livro de Minas, na capital mineira. Um evento muito bem organizado, mas com público aquém do esperado.

Valor do ingresso – R$ 10,00 (dez reais) – mesmo valor que em São Paulo, entretanto, com uma diferença populacional de 8.500.000 (oito milhões e quinhentas mil pessoas).

População de Belo Horizonte: 2.500.000 (dois milhões e quinhentos mil habitantes) e uma frota de 1.350.000 (um milhão trezentos e cinquenta mil) veículos. Renda per capita em 2009, cerca de R$ 18.182,00 (dezoito mil centos e oitenta e dois reais), segundo dados do IBGE.

3) Em 2011, 14ª Bienal do Livro do Rio, outro feira de grande sucesso de público. Evento que dispensa apresentações e maiores comentários.

Valor do ingresso em 2011 – R$ 12,00.

Dados populacionais: 6.000.000 (seis milhões de habitantes) e uma frota de 2.200.000 (dois milhões e duzentos mil) veículos. Renda per capita em 2009, cerca de R$ 22.102,00 (vinte e dois mil cento e dois reais), segundo dados do IBGE.

Parece-me que três fatores: população, renda per capita e valor de ingresso, tem forte influência sobre os dados finais de visitação num determinado evento. Mas gostaria de dar ainda mais dois exemplos.
No ano de 2011, durante a Bienal do Livro de Pernambuco, os quatro primeiros dias do evento tiveram uma visitação insatisfatória, bem abaixo do esperado. Pelo primeiro ano a organizadora da Bienal de Pernambuco resolveu cobrar ingresso; e olha que só custava R$ 3,00!!. No quinto dia da feira a Andelivros conseguiu uma liminar na justiça proibindo a cobrança do ingresso; Não precisa nem dizer que nos dias subseqüentes à decisão da justiça, ou seja, sem bilheteria, o público aumentou em 500%. Confesso que não parecia a mesma feira, parecia outra Bienal. O sucesso estava estampado no sorriso dos expositores, tendo em vista que o público lotava os corredores da feira.
No mesmo ano, outro problema parecido na Bienal do Livro da Bahia, 95% dos expositores fecharam seus estandes em protesto à baixa visitação durante os primeiros dias da feira. Após esta medida, a organizadora baixou o valor do ingresso de R$ 8,00 para R$ 4,00, aí sim a feira mudou da água para o vinho.
A conclusão que chego é que, não podemos fechar os portões das feiras àqueles que não têm condições de pagar um valor absurdo por um ingresso. Entendo que há um custo (organização de uma feira) e, um objetivo de lucro, o que é comum a todas as empresas. Contudo, não podemos aceitar, sem nem ao menos tentarmos ou estudarmos uma nova forma de cobrança de ingressos visando o acesso ao livro a todos os cidadãos de nosso país, sem distinção de posição social, renda, etc.
Chamo a atenção para duas Bienais que acontecerão neste ano, são elas: Bienal de Minas e Bienal de São Paulo, ainda há tempo de pensarmos sobre o valor cobrado pelos ingressos. Cabe a nós, livreiros e defensores do livro (editores, distribuidores, autores, entidades, governo, entre outros), tomar frente por uma feira que cumpra realmente o seu papel cultural que, com toda certeza, na é o de fechar suas portas às classes menos favorecidas, por meio da cobrança de um ingresso seletivo e limitador de público.
Marcelo Gonzaga
Sócio Gerente – Top Livros

DESATANDO O NÓ DA DISTRIBUIÇÃO


 

Conversando com Carlos Fialho, a caminho de uma praia (este detalhe inútil é uma homenagem ao calor que faz agora em BH), em Natal/RN, em janeiro do ano passado, me ocorreu uma ideia que logo passei a ele: se cada editor pequeno comprar, a preço de custo, um certo pequeno número de livros de outro pequeno editor, não teríamos uma grande rede de distribuição no Brasil?
Falei também com meu amigo Carlos Schroeder, escritor e editor, lá em Jaraguá do Sul/SC. Fiquei com a impressão que ambos gostaram da ideia.
Não seria preciso criar uma associação nem nada. Se os livros da Jovens Escribas vão circular em Jaraguá e os livros da Editora da Casa vão circular em Natal, já temos um bom começo. Se os livros da sabarense Dubolsinho entrarem no circuito... e os da Mazza... e os de outras em outras cidades...
Quanto mais penso nisso, melhor a ideia me parece. Claro, fantasmas de picaretas cruzam sombras diante de meus olhos. Mas onde não os há? Quase todas as pessoas que conheço envolvidas nesse processo são legais, éticas, querem mais coisas boas que apenas dinheiro.

GRANDES PEQUENAS EDITORAS



Acabo de receber um mimo da editora Jovens Escribas: uma camiseta e três livros: A cega natureza do amor, de Patrício Jr., É preciso ter sorte quando se está em guerra, de Pablo Capistrano  e Uns contos de Natal, do Carlos Fialho.
De Patrício ainda não li nada, é um dos fundadores da JE, ao lado de Fialho e Daniel Minchoni. Mediou mesa de que participei lá em Natal, gente boa toda vida. Seu livro vai ser o primeiro desta lista.
Pablo estava naquela mesa comigo. Já li seu Simples Filosofia, coletânea de crônicas em que ele, mestre na área, fala de vários filósofos de forma clara e divertida. Me marcou o relato de sua experiência com os livros dentro de casa, na infância, muito parecida com a minha.
E Fialho é amigo do peito, já tem um tempo. Nos conhecemos quando ele veio lançar seu É tudo mentira, em BH, com produção da sparita Pilar Fazito. Dei uma força na divulgação, saímos em turma para passear depois do lançamento, ficamos amigos.
A publicação de meu Silas em 2011 pela Jovens Escribas começa com A ponto de explodir, meus contos publicados em 2008: ele gosta tanto desse livro, que comprou uns 20 exemplares para distribuir entre amigos, lá em Natal. E depois queria fazer uma segunda edição, no fim de 2010. Em vez de aceitar esse convite, propus editarmos meu projeto em fase de acabamento. Ele topou na confiança. Assim surgiu Silas, que foi uma das (muitas) alegrias do ano passado.
Fialho é publicitário e faz camisetas da editora, muito legais. Esta que ganhei agora é de promoção do seu livro. Vou usar, com o orgulho de ser um autor da casa.
(Ainda vou falar da JE no próximo texto.)

domingo, 26 de fevereiro de 2012

JOE COCKER VEM E EU NÃO VOU!



Joe Cocker vem a BH. Uma amiga ficou de comprar ingresso pra mim, não comprou; eu não tenho facilidade de ir até a bilheteria e não quero pagar nada além dos 160 reais do primeiro lote (o que já é muito pra mim, mas é o JC, pô...). Vou acabar perdendo este show. E daí? Eu tenho montes dele aqui no computador. Pra quê ir ao show?
Vi (participei é melhor) montes de shows que se amontoam na minha memória afetiva disputando lugar pra ver qual vai continuar na tela. Sou feliz por isso.
Mas como já perdi shows!
Eric Clapton no Mineirinho. O saudoso amigo Zé Joaquim passou anos me atormentando por eu não ter ido. Me sinto culpado até hoje.
Os Mutantes lançando Tudo foi feito pelo sol no ginásio do Minas. Lembro até da publicidade na TV. Foi meu primeiro disco (que toca sem um arranhão até hoje, mais de 30 anos depois).
Chuck Berry no Chevrolet Hall. Putz, como sou burro! Era o caso de economizar na combustível por uma semana pra poder ver o pai de Johnny. Mas, não, deixei passar.
Ah, mas e daí?
Acontece, camarada, que eu ouvi mais música que li – e isso não é uma obviedade. (Eu ouvi a música que li... bom isso.) Perder mais um show de um cara de quem gosto tanto...
Será?

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

VOCÊ, SER ESCRITO, É MESMO NEGRO?


O protagonista da novela Diz Xiz, que publiquei em 1991, tem lá suas aventuras durante umas 70 páginas e, somente ao final, revela:
(...) Quis ajudá-lo, mas ele me empurrou.
- Senta aí, crioulo, vou fazer seu retrato.
Não gostei. Não gosto que me chamem de crioulo.
- Sorria, negão!
Sim, Silas é negro. Mas em nenhum momento, também nos quatro contos que compõem o livro Silas (Jovens Escribas, 2011), ele assume qualquer dos discursos (ou vozes, expressões, referências...) que poderiam caracterizá-lo, explicitamente, como tal. Além dessa passagem, em Silas, 30 do º tempo, ele conta que um outro personagem presume que a atriz negra Josephine Baker seria sua irmã.
O que me importa aqui é: Silas pode ser negro sem assumir o lugar de um personagem negro?
Segundo o professor Eduardo de Assis Duarte, se entendi corretamente sua resposta a esta pergunta, não. O que caracterizaria a negritude de um personagem seria exatamente ele falar do (ou de um) seu lugar.
Especulo: se eu precisar de um personagem indígena em determinado enredo, como ele deverá ser informado? Eu precisarei determinar o seu grau de aculturação ou assimilação para definir sua fala, seu ponto de vista, sua reação e seu comportamento específicos ou poderei considerar que, como na vida real, existem indígenas que vivem na cidade, como cidadãos urbanos – sem deixarem de ser indígenas?
Então estou pensando que os negros da vida real também vieram de algum lugar e se adaptaram à vida não negra (e o que seriam essas vidas sem cairmos na caricatura?) de tal modo que não preciso, ao transpô-los para a literatura (como fiz com Silas) explicitar sua origem?
Mas... e os personagens não negros? “Estávamos caminhando quando se aproximou um negro.” Estou impondo ao leitor que esse “nós” eram diferentes de negros. Azuis? Vermelhos? Amarelos? Brancos, obviamente, porque eu autor parto do pressuposto senso comum que a humanidade (ao menos a escrita) é branca e a que não for precisa ser indicada ao leitor.