segunda-feira, 25 de abril de 2016

MARTA LEANDRO REGISTRA "LAMBE-LAMBE"

A fotógrafa Marta Leandro fez uma paráfrase de um dos textos do meu livro "Lambe-lambe".
Para mim, uma grande honra, pois significa uma interlocução de altíssimo nível com uma leitora.

Lambe lambe

(...)

São esses fotógrafos e fotógrafas para os quais suas câmeras são “o caderno de esboços, um instrumento da intuição e da espontaneidade, o mestre do instante que, em termos visuais, ao mesmo tempo questiona e decide”.

São esses fotógrafos e fotógrafas que pensam que “para “significar” o mundo é preciso sentir-se implicado naquilo que se recorta através do visor. Essa atitude exige concentração, sensibilidade, um senso de geometria. É por uma economia de meios e, principalmente, um esquecimento de si que se chega à simplicidade de expressão.” 

São esses fotógrafos e fotógrafas para os quais “fotografar é prender o fôlego quando todas as nossas faculdades convergem para captar a realidade fugidia; é aí então que a apreensão de uma imagem é uma grande alegria física e intelectual.”

São esses fotógrafos e fotógrafas para os quais “fotografar é num mesmo instante, e numa fração de segundo, reconhecer um fato e a organização rigorosa das formas percebidas visualmente que exprimem e significam esse fato. É pôr na mesma linha de mira a cabeça, o olho e o coração. É um modo de viver”.

São esses fotógrafos e fotógrafas que, como eu, veem beleza em tudo, porque desconfiam que em tudo está contido o belo, e seu desafio é fazê-lo se revelar; 

São esses fotógrafos e fotógrafas que, por saber que fotografar é escrever com a luz, tem por missão encontrar a  luz que anima cada ser - e que os torna únicos e belos -  e escrever com ela uma história. 

Minha missão na fotografia, e na vida, é a busca incessante da luz.

Inspirado no texto "Fotógrafos", do livro, "Lambe, lambe", de Sérgio Fantini. Ed. Jovens Escribas, 2016.

Entre aspas: Henri Cartier-Bresson, em "O imaginário como ele é", Clair, Jean. II. Cosac Naify, 2011

sexta-feira, 22 de abril de 2016

RONALDO SIMÕES COELHO SOBRE "LAMBE-LAMBE"

Caro FAntini: fiquei apaixonado pelo seu livro. Nao consegui parar de ler e reler essa obra prima da nossa literatura, esse espelho da realidade que nos cerca e que nao vemos. Um estudante de SPaulo se vestiu de gari e defendeu a tese dele baeado nessa experiencia. Nenhum colega, nem professor o reconheceu, apesar de passarem por ele muitas vezes. Seu olhar é fascinanta, mas aliado a seu modo de escreve (quase poética) me comeveram demais. 
Nasci e vivi anos no contrario, pois minha casa era de todo mundo, desde o Zé Pretinhao (que era branco) como o Zé Branquinho (que era preto), muito amigos desde que nasceram. Ou como a sá Leonidia, que rachava lenha com o machadoi com que tinha matado o marido, nos crianças ao lado dela e das madeiras, ouvindo o tempo todo ela falando sozinha (nota: SÓ VIM A DESCOBRIR O QUE ERA QUANDO, JÁ MEDICO, PUDE VER QUE ELA COMIA TODOS OS COGUMELOS DOS TRONCOS QUE FERIA COM A MESMA GANA COM QUE TINHA PARTIDO O CÉREBRO DO MARIDO, QUE BATIA NELA E A MALTRATAVA). 
acho que seu livro deve ter um segundo volume, pois SÃO ELES muitos. 
Meus parabens, obrigado. Abraços e parabens. R.

LAÉRCIO JOSÉ PEREIRA SOBRE "LAMBE-LAMBE"

TREINANDO O OLHAR E A PERCEPÇÃO
Sou especialista em equipamentos fotográficos, já consertei de tudo, das Hasselblads às Zenzas Bronicas, das Kodak xeretas aos obturadores Synchro-Compur dos lambe lambes. Entender o processo não me fez fotógrafo, fazer alguns cursinhos básicos também não. Em um desses cursinhos o palestrante da Fuji perguntou, “Qual é o melhor fotógrafo do Brasil?”, ninguém respondeu, ele disse, “O melhor fotógrafo do Brasil é o que tem casa na zona sul, dois carros importados, apartamento em Cabo Frio, e faz viagens internacionais”. Eu questionei: —Esse não é o melhor, é o de sucesso, o melhor está longe dessa descrição — Ele me deu razão, mas acrescentou: “Arte não dá dinheiro, Laércio”.
Como fotógrafo eu nunca fiz sucesso e nem ganhei dinheiro, mas também nunca segui modismos.
Acabei me transformando em orientador para uso de equipamentos do tipo: Saiba conseguir o melhor do seu equipamento. Isso não é ser professor de fotografia, mas inclui noção da fotografia básica. Quando os alunos, sempre particulares, querem mais eu sempre dou a mesma dica: A boa fotografia é feita com as aulas, mas é principalmente uma exteriorização de todos os livros que você lê, de todas as galerias que você visitar, de todos os filmes que você assistir. Deem uma boa olhada no site http://www.bhumafotopordia.com/ do Charles Tôrres e você entenderá o que estou dizendo.
Por pensar assim que indico a leitura de boas crônicas, sendo simplista porque a literatura é muito mais que isso, a crônica é um retrato, é um instantâneo. Dentre tantos bons, dois grandes autores contemporâneos são o Sérgio Fantini e a Ana Elisa Ribeiro. O novo livro do Fantini, LAMBE LAMBE, faz uma homenagem aos fotógrafos profissionais do parque municipal. Todos os textos são como fotografias bem feitas da sociedade, cruas e nuas. Eu indico para os estudantes desta arte que querem fazer a diferença. Indico para os profissionais que creem erroneamente que o equipamento é o mais importante. Fotografia bonitinha é fácil, é só colocar a câmera no automático e apertar o botão. Contar uma história não é tão fácil, é preciso treinar o olhar e a percepção.
Laércio José Pereira

ADRIANE GARCIA SOBRE "LAMBE-LAMBE"

A fotografia despudorada de Sérgio Fantini ou os olhos da empatia

 Por Adriane Garcia

    Passo pela cidade, minha cidade, tão feinha Belo Horizonte por onde passo. Lá onde veste seu melhor vestido, vou vez em quando, vou para lazer. No “todo dia”, percorro o que é para ficar no escuro.
    Há livros que não mudam nada, há livros mudos. Há livros que nos mudam, verdadeiros incômodos a cutucar verdades guardadinhas. E há livros que mudam a forma como olhamos as coisas. E isso é irremediável.
    Agora não tem mais jeito, abri este livro de fotografias. Este lambe-lambe não contente em lançar seu flash de magnésio pela sua própria vida, fez o favor de publicar suas impudências. Lançou luz sobre o escuro e não parei mais de ver a mendigaria, os moradores de rua, os gatos no parque, os camelôs e sua algazarra, os favelados, os hippies vendendo suas bugigangas e expondo essas diferenças do que somos, os meus preconceitos e os meus pós-conceitos flagrados.
    Nunca mais passar pelo Parque Municipal apenas passando, agora é ver os velhos, a sua solidão, os bancos sempre ocupados e essa vontade de gritar que quero me sentar na grama porque não aguento mais esse mundo imundo. Agora é olhar para o passado e me lembrar de minha mãe empregada doméstica, tão incômoda e tão necessária na casa dos patrões. Mamãe mulata, linda, jovem, passando por cima de assédios para não perder emprego e mudando móveis de lugar na ingenuidade amável de quem pensa que está agradando.
    Minha cidade que se droga para ver, que se droga para não ver. Os carroceiros de minha infância, os cavalos que comovem todas as crianças, pois nenhuma criança jamais entendeu a violência contra os cavalos. Agora saio pensando na violência contra os carroceiros, sua vida de açoite, essa transferência de quando as metáforas estão materializadas, quando sou interrompida pela inércia calculada dos jogadores de dama da praça 7 de Setembro. Quando um grito de um pastor evangélico quer sobrepor toda identidade. Cidade louca. Eu penso: independência ou morte.
    Valei-me. Continuo o álbum e vejo: que nunca entrei numa barbearia. Sempre as olhei de fora com muita curiosidade, as suas cadeiras-máquinas-do-tempo. E este cachorro na porta, fotografado pelo lambe-lambe, eu posso jurar que já o vi.
    É pela manhã que saio todos os dias, transporte público, esses motoristas que trabalham seis viagens sem parada, que almoçam em 15 minutos, que fazem suas necessidades fisiológicas em banheiros fétidos que as empresas de ônibus não se dão ao trabalho de mandar limpar. Digo a eles bom dia porque sei que não é fácil. Muitos respondem, surpresos que alguém ainda os veja. Agora é assim.
    Saio clicando com a lente do lambe-lambe, a cidade vai mudando aos pouquinhos e ainda carregando um tanto do que foi há 117 anos. Há 300, quando ainda era um arraial, mas trazia tantos pés descalços. Ao menos o amor mudou. Eu também já achei estranho as duas meninas se beijando publicamente. Como seria uma cidade que se beijasse?
    Nas páginas entre os contos, encontrei esses 3×4, amarelando. Anônimos que se tornam especiais apenas ali, na lateral da máquina-caixote de fotografia. Estão chegando na rodoviária, vêm tentar uma nova vida nesta Belo Horizonte, acreditam na promessa deste nome. E agora, iluminada por quem não tem medo de lamber o vidro, de verificar qual lado da chapa é doce e qual é o amargo, talvez eles possam se localizar.
    Passei a andar com este livro. Vou e volto para casa. Sim, eu encontro o caminho.
A verdadeira literatura é a que nos mostra o quanto estamos perdidos.

AKIRA YAMASAKI SOBRE "LAMBE-LAMBE"

fantini
eu nunca tinha ouvido falar no Sérgio Fantini até que
no ano passado ele veio com erre amaral, germano
quaresma e adriane garcia para um evento na casa
de farinha e casa amarela, denominado caravana
holliday, que foi um grande sucesso e mobilizou boa
parte da comunidade artística/cultural de são miguel
paulista.
acabei ficando neste dia com dois livros do fantini
que entraram na fila de espera para serem lidos, eu
confesso que sou um leitor muito preguiçoso mesmo
e se uma leitura não pega no tranco acabo deixando
de lado para uma outra ocasião, quando certa noite
comecei a folhear com displicência o "novella" para
esperar o sono chegar e fui fisgado para sempre
por suas novellas, tanto que saí para trabalhar no
dia seguinte sem dormir por minuto sequer, dizendo
para mim mesmo que esse cara não é tudo isso não.
sou um cara que não sei analisar um livro, conteúdo,
formatos, escolas, influências, essas coisas, a única
coisa que sei é gostar ou não gostar de um livro, não
me perguntem porquê. o que sei é que algum tempo
depois li o "a ponto de explodir" e vi o fenômeno se
repetir como num vídeo-tape da leitura do "novella" e
só consegui desgrudar do livro quando terminei a
ultima narrativa, mas continuei a não dar o braço a
torcer, esse cara não é tudo isso não.
hoje comecei a ler "lambe-lambe", lançado na casa
amarela no mês passado, já li cerca de cinco ou
seis contos e estou tão impressionado com este livro,
deslumbrado, eu diria, com este espantoso painel
de rostos anônimos que ganham vidas e histórias
nestes contos tipo jabs curtos e contundentes, que
interrompi a leitura para fazer esta postagem e para
dizer que dou o braço a torcer: sérgio fantini é tudo
isso sim é mais que tudo isso é um grande mestre é
um escritor da raberuânica estirpe dos baitas.
akira - 02/04/2016.